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Moradores da região também venderam íris e não receberam

Projeto que coletava os dados da íris das pessoas foi proibido por violar a livre escolha ao oferecer pagamento em troca dos dados

Tatiane Pamboukian
23/02/2025 | 09:15
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FOTO: Freepik


O Projeto denominado Worldcoin, desenvolvido pela Tools for Humanity, realiza a coleta dos dados das íris das pessoas com o intuito de fazer um banco de dados de uma “impressão digital” mais moderna. No entanto, para alguns moradores da região ter o olho fotografado tornou-se uma forma de ganhar um dinheiro extra, já que a empresa remunera quem se disponibiliza a escanear sua íris.

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A contrapartida financeira é vista como ilegal pela ANPD (Agência Nacional de Proteção de Dados), que probibiu o pagamento por tais dados, considerados pessoais. A decisão prejudicou a moradora do Grande ABC Isabela, que preferiu não se identificar por segurança, pois ela acabou não recebendo a segunda parcela do acordo. O valor que seria pago em duas parcelas, em criptomoedas, correspondia ao todo a cerca de R$ 600, mas o montante variava pela cotação do dia em que for resgatado. Os valores ficavam disponíveis em um aplicativo, por onde era solicitado o saque, interrompido após a decisão. “Com a primeira parcela eu não tive problemas, mas quando fui pegar a segunda não consegui. Eles excluíram minha conta, salva no meu celular, e depois quando fui recuperar deu que não existia”, relata.

Moradora de São Bernardo, a assistente de processos Marina Siqueira, 28 anos, quando soube do projeto, decidiu se candidatar para participar. Diferentemente de Isabela, Marina quis viver uma experiência diferenciada, não tendo a recompensa financeira como principal finalidade. O caso dela está enquadrado no que a ANPD considera como uma disponibilização por livre e espontânea vontade. 

A ANPD entende que não há liberdade de escolha para pessoas em situação de vulnerabilidade quando retribuições financeiras são oferecidas, suspendendo a oferta de criptomoeda ou de qualquer outra compensação financeira pela coleta de íris. 

De acordo com informações da ANPD fornecidas ao Diário, a suspensão passou a valer em 11 de fevereiro. “A decisão final quanto à possibilidade de realizar o tratamento de dados pessoais ocorrerá quando for analisado o escopo geral do tratamento e emitido o posicionamento de mérito no âmbito do procedimento de fiscalização nº 00261.006742/2024-53.” A advogada Mônica Villani, membro da Comissão de Direito Digital e Compliance da OAB de São Bernardo e membro da Comissão Especial de Privacidade e Proteção de Dados da OAB/SP, explica que a íris, na forma e na finalidade que é coletada, é uma informação biométrica e, consequentemente, é definida pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) como dado pessoal sensível. 

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“Segundo análise da ANPD, o pagamento em criptomoedas pode influenciar a vontade do indivíduo na hora de decidir pela disponibilização de seus dados biométricos, sobretudo em situações de vulnerabilidade ou hipossuficiência. Além disso, há a impossibilidade de excluir os dados biométricos já coletados, o que torna a revogação do consentimento irreversível”, afirma a advogada. 

O especialista em Tecnologia e Inovação, Arthur Igreja, diz que a alegação da empresa sobre garantir uma prova de humanidade com uma biometria mais robusta que o reconhecimento facial ou impressão digital é algo crível. “Estamos entrando em uma era em que uma IA (Inteligência Artificial) pode se passar por uma pessoa. No entanto, se a empresa sofrer um vazamento de dados, não será apenas de usuário e senha, mas de algo biométrico, um identificador da pessoa, então é algo muito mais grave”, aponta. 

Mônica recomenda a quem cedeu as imagens de sua íris e se sentiu lesado pelo projeto buscar reparação por danos em órgãos oficiais como os Procons e a ANPD. “As pessoas que ainda não participaram do projeto, mas têm interesse, é recomendável bastante cautela, sendo essencial a leitura dos Termos de Uso e dos Avisos de Privacidade disponibilizados tanto pelo aplicativo World App como pelo dispositivo Orb, e também toda e qualquer outra documentação relacionada à participação do projeto e sobre o funcionamento da World ID”, alerta.




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